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Opinião: Pela sobrevivência da rádio
Opinião
Publicado em 21/05/2024

A lei da rádio talvez precise de ser revista e alterada. 

A expansão de rádios que primeiro nascem como locais, propriedade de grupos de comunicação que se querem afirmar como nacionais, está a levar ao desaparecimento da verdadeira rádio local. 

Surge esta reflexão a partir de uma informação que dá conta da passagem de administração de uma rádio local no interior do país, para outro grupo de comunicação, onde se comenta que, por um lado, muitas rádios locais, hoje, já não cumprem a sua missão de serviço e, por outro, com a aquisição por grupos maiores se perde totalmente o sentido de rádio local. Nesta rádio em causa,  trata-se de uma estação fundada nos anos 30 que deixa para trás toda a sua história de serviço público a uma região. 

 

É mais uma rádio local a perder o seu espaço, para o vender a grupos que podem investir e crescem com a pobreza de outros que não conseguem fazer face à necessidade de actualização e de modernização. É mais uma rádio a deixar de prestar serviço público local, na proximidade com as suas gentes. 

Se, em determinados lugares, se enfrenta o problema do despovoamento, a perda de uma rádio local deixa de ser a presença e a companhia de quem já se sente só.  

 

Com o avanço tecnológico e o aparecimento de plataformas digitais, a rádio hertiziana tem vindo a enfrentar a dificuldade de se conseguir actualizar e de se reinventar. O mistério da voz da rádio cujo rosto não se conhecia, deixou de existir porque a rádio agora também é vídeo. A rádio que passava a música que pedíamos num simples telefonema, agora está ao alcance de um qualquer dispositivo móvel, em qualquer momento e sem precisar de telefonar. A rádio que era companhia, esclarecia, ensinava, ajudava, fazia-se presente na vida de cada um e nas famílias, tem vindo a tornar-se, em muitas situações e com as respectivas e boas excepções, uma rádio impessoal. Surgiu, no entretanto, uma rádio de bolso com o aparecimento e o aumento de podcasts, que alargaram  temáticas e possibilidades de chegar a públicos diversos. Podemos dizer que existem, assim, públicos mais fechados e especializados, conforme o produto que é oferecido e a escolha de cada um. 

 

Há muito tempo que as pequenas rádios foram sendo 'obrigadas' a vender espaços de transmissão a determinados grupos sociais para encaixarem mais alguns fundos necessários à sua subsistência. No que diz respeito à realidade da rádio local, é impensável que esta tenha como primeiro objectivo o lucro de quem a administra. Não acredito que seja possível enriquecer com os lucros de uma rádio local, mas o serviço que ela presta enriquece a comunidade onde se insere e por isso deveria ser ajudada a sobreviver porque é de todos. 

 

Nos primórdios da rádio ‘pirata’ que levou depois à necessidade da legalização para maior controlo do espectro hertziano,  a rádio local vivia do voluntariado e da boa vontade de muitos generosos. Era uma rádio que chegava a todos e era para todos. Com o passar do tempo, sabemos que a rádio, já profissionalizada, tem custos e em muitas a publicidade existente não é suficiente para a manter, inclusive, nas obrigações laborais e mesmo as de funcionamento relacionadas com direitos autorais e outras.

 

É pena que a lei da rádio não contribua para preservar a característica local das rádios, como nasceram e deveriam continuar, com a preocupação de servir uma comunidade local. 

Cada vez mais impõem-se aqueles que conseguem investir e crescem conquistando mercados a nível nacional e não se ajuda quem presta serviço público junto das comunidades locais. Também sei que muitas vezes não há quem queira dedicar-se a levar para a frente um projecto de comunicação que pode ter nascido a partir da carolice de alguém, mas, com as condições de hoje é difícil a motivação, mesmo quem tenha boa vontade. 

 

Li há algum tempo que a Entidade Reguladora para a Comunicação (ERC) terá solicitado à ANACOM a possibilidade de disponibilização de  micro frequências para pequenas estações de rádio, de âmbito mais comunitário, poderem fazer serviço público. Acredito que essa pudesse ser uma forma de continuar a fazer serviço público localizado e com menos custos. 

Quem me conhece sabe que sou um apaixonado pela rádio e 'nasci para esse mundo’ na rádio local feita com paixão e dedicação. Mas, hoje, vejo as rádios locais a desaparecerem porque a Lei não favorece os mais pequenos e permite aos maiores ocupar o espaço que não lhes pertenceria.

 

Pe. Nuno Rosário Fernandes

Diretor 

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